Em lembrança de Elvira Varela Bao, mestra gratuita e ponte de memórias.
Uma das miragens que nos deixou a tradição quebrada do galeguismo é a das IF como cenáculos de intelectuais, artistas e académicos, alguns já ativos no regionalismo do século XIX. Porém, a que se desprende das memórias e das fotografias fala de ativistas, gente nova que se reunia e fazia tertúlia, excursionismo, teatro, música, que compartilhava livros e conhecimentos, que tinha um jornal reivindicativo e participava em protestos políticos, sociais e nacionais.
Na da Crunha destaca a quantidade de mulheres nessa vida associativa. Protagonistas que vão saindo à luz graças ao trabalho pioneiro de tantas ativistas contemporâneas e pelas que podemos considerar que houve uma incorporação numerosa de mulheres à IF em 1917. Graças à campanha de abril e maio para angariar fundos e fabricar o estandarte conhecemos os nomes das assinantes (vid Marco Irmandiñas, p. 63).
Na Irmandade da Crunha destaca a quantidade de mulheres na vida associativa. rotagonistas que vão saindo à luz graças ao trabalho pioneiro de tantas ativistas contemporâneas
Isto parece ter provocado uma mudança. O regulamento da Sociedade Os Amigos Da Fala Gallega (24/6/1916) não menciona uma única vez a palavra “Muller”. Mas, na Modificação do Regulamento (12/6/18) “Os AmigOs da Fala” passam a ser “Irmandade da Fala”:
ARTICULO ‑VIII- Pueden ser socios de esta sociedad todos los gallegos ‑hombres y mujeres- mayores de 16 años y todos aquellos que sin serlo de nacimiento lo sean de corazón. […] Las mujeres que ingresen en esta sociedad constituirán una sección femenina que se regirá por si misma nombrando de entre sus miembros una directiva igual a la de la Irmandade si bien el presidente de esta será común a ambas.[…]
ARTICULO ‑IX- En donde no exista una Irmandade da Fala pueden crearla las mujeres y ella tendrá la misma autoridad que si estuviera constituida por hombres.
E no regulamento de 1932, na IF como secção do PG:
Artículo 3º- Podrán ingresar como socios todos los gallegos mayores de 16 años hombres y mujeres o avecinados en la demarcación respectiva que lo soliciten, siempre que se comprometan a defender integramente el programa del partido y se sometan a los preceptos de este Reglamento y firmen la ficha de filiación del Partido Galeguista.
A. Villar Ponte defenderá “El sufragio femenino” (LVG 13–1‑1918). No manifesto “Aos Galegos residentes nas Américas” (assinado “Por todal-as Irmandades de Galicia, A Diretiva da Crunha Xulio de 1918”) indica nos seus Fins:
6º Um amplio espíritu feminista, faguendo Irmandades femininas, por entender que a muller en Galicia debe têr mais direitos que os qu’as leises oxe lles conceden.
No Manifesto de Lugo, entre os Problemas constituentes:
2º. Autonomia municipal, distinguindo o municipio aldean do vilego, axeitándose o Concello aldean sóbor da base do reconocimento da persoalidade xurídica das parroquias, que terán as súas Xuntas, elexidas antr-os cabezas de familia, (petrucios) homes ou mulleres, pra termaren dos seus bés privativos.
E como primeiro dos Problemas Políticos (III. 1):
1º. Igoaldade de dereitos pr‑a muller.
E em Cuestiós Xurídicas (V.3):
4ª. Igoaldade de dereitos da muller casada pol‑o menos no caso de emigrazón do marido.
Os direitos que reclamam são representação, voto e a igualdade jurídica (emancipação, propriedade) décadas antes de que na Espanha tenham qualquer reconhecimento. Mas a ausência de assinaturas femininas na fundação e nos manifestos é notória. Por que se integram nesse clube de senhores, em 1917 tantas, independentes, formadas, com discurso e reivindicações?
A resposta talvez é que ao abrigo legal da IF constituem uma organização própria:
o derradeiro domingo houbo xunta xeneral da “Irmandade Femenina” da Cruña que conta con mais de dous centos d’axuntadas. Con fondonísimo entusiasmo elixeuse a seguinte direitiva: Conselleira, Dª Josefa Vázquez; segredaria Dª Elvira Brabo(sic); vicesegredaria Dª Teresa Chao; contadora Dª María Balboa; tesoureira, Ermita López; vocás doña Micaela Chao, Dª Rosa Martínez, doña Avelina Fernández, Dª Teresa Fernández, doña María Miramontes, Dª Genoveva Casal y Dª Avelina Sardina. Ista importantísima seición feminina vense orgaizando por grupos e distritos. E unha cousa exemprar, que honra a Galicia, ás mulleres galegas e que debe ser imitada. (ANT, 23-12-1918, “Novas da causa”)
O peso das galeguistas no sufragismo da Crunha, nas associações de mulheres republicanas, seria forte. Pelo momento conhecemos as margens: biografias parciais, dados dos quais emerge uma confluência entre uma elite intelectual e de classe e a vanguarda social
O peso das galeguistas no sufragismo da Crunha, nas Associações de mulheres republicanas, seria forte. Pelo momento conhecemos as margens: biografias parciais, dados dos quais emerge uma confluência entre uma elite intelectual e de classe (mestras, artistas, famílias da burguesia comercial, depois jornalistas, taquígrafas) e a vanguarda social (costureiras, telefonistas, tendeiras, cozinheiras, pequena industria, empregadas de serviço, operárias). O magistério moderno das Maria Barbeito, Jacinta Landa, Lopez Jean, Elvira Bao, (e as mestras saídas da Escola Normal de Magistério); os espaços de reunião artística com saída profissional na classe média, a música, a pintura e teatro (as irmãs Chao, Maria Balboa, Concha González); as iniciativas de formação profissionais, gremiais, sindicais (Maria Miramontes, Genoveva, Casal, Josefa González).
Mulheres “muy siglo XX”, incorporadas ao mundo laboral, que irrompem, com debate, nos espaços sociais, formativos e associativos (por fora da igreja e a Caridade que – nas classes altas — limitara as gerações anteriores). Os feminismos laicistas, republicanos e librepensadores anteriores reorientam-se para posturas abertamente sufragistas e de reivindicação laboral e de direitos.
A manifestação definitiva deste feminismo coalha no Manifesto “Habla la mujer galega: respuesta a un Manifiesto”, contra o Manifesto fundacional da ANME Asociación Nacional de Mujeres españolas, de janeiro de 1919. O manifesto é fulcral porque destaca que as mulheres na IF eram já um grupo organizado; estavam ao dia do que em sufragismo se fazia e queriam marcar uma Posição Nacional galega. (Marco: Irmandiñas, p. 40 e ss.)